Estudo entrevistou médicos, enfermeiros e farmacêuticos
A prescrição de medicamentos antipsicóticos para pacientes adultos que sofrem com delirium e agitação é procedimento comum, mesmo que ensaios clínicos randomizados tenham mostrado que essa intervenção não altera a incidência ou mesmo a duração do delirium em pacientes críticos. Usando essas evidências, há alguns anos, a Society of Critical Care Medicina fez recomendações contra o uso desses medicamentos.
Corroborando com esse cenário, um estudo recente publicado pelo Journal of General Internal Medicine realizou 21 entrevistas com 11 médicos, cinco enfermeiros e cinco farmacêuticos no Canadá a fim de compreender quais fatores individuais e hospitalares influenciam a prescrição e a desprescrição de medicamentos antipsicóticos em pacientes críticos. Importante destacar que 13 entrevistados trabalhavam em UTIs e 8 em enfermarias.
Uma das percepções importantes de serem destacadas diz respeito ao fato de que esses medicamentos têm sido utilizados para delirium e agitação, mas também com o intuito de manter o paciente e a equipe seguros, gerenciar o sono, e suprir a falta de disponibilidade de profissionais.
Fatores relevantes de influência
Para avaliar quais os fatores relevantes de influência, o estudo utilizou um quadro chamado Theoretical Domains Framework que sugere 14 domínios. Sete deles apresentaram relevância. Abaixo detalhamos cada um:
1) Papel social, profissional e identidade
>> Significado: conjunto de comportamentos e qualidades pessoais de um indivíduo diante do ambiente social ou de trabalho;
>> Achado: houve compromisso de buscar intervenções não farmacológicas antes de aderir ao tratamento medicamentoso.
2) Crenças sobre capacidades
>> Significado: aceitação da verdade, da realidade ou da validade de suas habilidades e talentos;
>> Achados: profissionais de saúde tendem a acreditar que os antipsicóticos são os que promovem efeitos sedativos mais seguros. Porém, há profissionais que discordam dessa crença.
3) Reforço
>> Significado: aumento da probabilidade de uma relação dependente entre estímulo e resposta;
>> Achados: muitos profissionais de saúde aderem ao uso de antipsicóticos como forma de ampliar a segurança do paciente e das equipes.
4) Motivação e objetivos
>> Significado: representações mentais de resultados a serem alcançados;
>> Achados: o uso de antipsicóticos comumente está atrelado à meta de manter o paciente seguro, manejar o delirium e garantir a atuação tranquila das equipes.
5) Memória, atenção e processos de decisão
>> Significado: capacidade de reter informações, focar em aspectos específicos e tomar decisões;
>> Achados: enfermeiros atuando nas enfermarias têm sobrecarga cognitiva devido às altas demandas e prioridades clínicas que influenciam as recomendações para uso de antipsicóticos.
6) Contexto ambiental e recursos
>> Significado: situações do ambiente capazes de encorajar ou desencorajar o desenvolvimento de competências e habilidades;
>> Achados: efeitos adversos ao medicamento antipsicótico foram relatados como consequências graves, mesmo assim, a cultura organizacional quanto ao uso dessas intervenções permaneceu inabalada; falta de equipamentos, monitoramento e equipes foram apontados como fatores problemáticos.
7) Crenças sobre as consequências
>> Significado: aceitação dos resultados de um comportamento acionado em determinada situação;
>> Achados: há certa tensão entre a expectativa dos resultados e as consequências do uso de antipsicóticos. Há, também, divergências, já que alguns profissionais acreditam que esses medicamentos são a melhor alternativa disponível, enquanto outros têm dúvidas sobre os efeitos positivos.
Manutenção do antipsicótico na alta
Os entrevistados também sugeriram estratégias para evitar que os pacientes tivessem alta com uma prescrição desnecessária de antipsicóticos. Entre as indicações estavam uso de uma ferramenta direta de comunicação entre os prescritores durante a transição de cuidado; responsabilidade pela prescrição; reconciliação de medicamentos na hora da alta e sessões educativas sobre prescrição e desprescrição de antipsicóticos.
Conclusão
Por fim, o estudo conclui que as unidades de saúde seguem prescrevendo antipsicóticos com o intuito de garantir a segurança dos pacientes mesmo que essa intervenção não tenha base em diretrizes e evidências científicas. O Dr. Lucas Zambon, diretor científico do IBSP, destaca que esta é uma das áreas mais complexas dentro do cenário de segurança do paciente crítico, tal qual ressaltou:
Se por um lado, o uso de antipsicótico não se associa em estudos a desfechos como mortalidade, por outro, muitas vezes é um dispositivo de segurança contra eventos adversos de naturezas distintas, como perda de dispositivos em terapia intensiva, por exemplo. Equilibrar escolhas e gestão de riscos em doentes críticos exige a tolerância sobre os resultados das intervenções. Não existe ausência de riscos nesses casos, o que há é alternância entre quais riscos estão sendo tratados em detrimentos de outros que surgem de forma não intencional. O mais importante é o olhar dinâmico sobre o paciente crítico e uma compreensão sobre a complexidade dos fenômenos nesses casos.
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