A segurança do paciente no atendimento pré-hospitalar é um assunto que precisa ser muito mais discutido dentro do setor de saúde. Foi com o intuito de ampliar esse debate, fortalecendo o banco de dados sobre a temática, que Eric Rosa Pereira optou por desbravar o segmento em sua tese de mestrado na Escola de Enfermagem Anna Nery da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
A partir desse estudo que, com orientação de Graciele Oroski Paes, se prolongou por sete meses e envolveu mais de 440 horas de observação de atendimentos, o especialista criou o trabalho intitulado “A segurança na administração de medicamentos no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU)”.
Premiado durante a terceira edição do Seminário Internacional de Enfermagem para Segurança do Paciente, evento realizado pelo IBSP dias 24 e 25 de outubro, o trabalho científico identificou incidentes relacionados à administração de medicamentos dentro dos atendimentos do SAMU e apontou estratégias para reduzir esses incidentes.
“Trabalhei por três anos no SAMU e, durante esse período, observei alguns incidentes de segurança no atendimento pré-hospitalar”, comenta o especialista. Ao identificar que a literatura era superficial e não atendia às dúvidas sobre o tema, Pereira passou a se dedicar à compreensão de onde estão as falhas nesse atendimento e quais os melhores caminhos para minimizar os riscos.
O estudo descritivo observou 239 ocorrências em ambulâncias básicas e avançadas entre julho de 2018 e fevereiro de 2019. Como resultados, Pereira aponta pontos positivos e negativos: o medicamento foi administrado no paciente certo em todas as ocorrências; 99,2% das doses foram ministradas de acordo com a prescrição; havia espaço próprio para armazenamento da medicação dentro da ambulância em 99,2% dos casos; e não houve reação adversa devido à medicação em nenhum dos atendimentos. Porém, a preparação do medicamento não foi adequada na maioria das vezes.
Para Pereira, é preciso dedicar tempo e esforços na criação de diretrizes para garantir a segurança dos pacientes durante esses atendimentos pré-hospitalares. “Estamos falando sobre ambientes específicos de cuidado, visto que no atendimento pré-hospitalar há influência climática e fatores físicos como locais de difícil acesso, ladeiras, ribanceiras, vias e rodovias”, pontua ao mencionar que não é adequado trazer os parâmetros de um atendimento dentro de uma unidade hospitalar – amplamente controlada – para a realidade de um cenário externo.
Outro ponto enfatizado pelo especialista abrange o ambiente regulatório da saúde. A RDC nº 36/2013 da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) (1) institui ações para a segurança do paciente em serviços de saúde, porém exclui a necessidade de núcleos de segurança no modo de urgência. “É preciso mudar a política de saúde e, a partir daí, garantir que consórcios e municípios invistam na criação desses núcleos”, esclarece. Para Pereira, a partir do momento em que uma resolução exclui a necessidade de uma ação, ela a está negando.
Essa realidade onde ainda há pouca atenção à segurança do paciente no atendimento pré-hospitalar não é exclusividade do Brasil. Um estudo editado no Canadá (2) concluiu que mesmo representando uma área de alto risco para erros e danos, o atendimento de emergência antes da chegada ao hospital ainda recebe pouca atenção. A revisão sistemática considerou o período entre 1999 e 2011 e recuperou 5.959 títulos, sendo que apenas 88 publicações atendiam aos critérios de inclusão.
Nos Estados Unidos, a Agenda Nacional de Pesquisa SEM (3), publicada pela NHTSA (National Highway Traffic Safety Administration), traz recomendações diretas sobre pesquisas em serviços médicos de emergência. O texto reconhece que os profissionais que trabalham com emergências de saúde atuam da melhor forma possível com os recursos que lhe são disponibilizados, porém tratam pacientes com pouca ou nenhuma evidência de que o atendimento que está sendo oferecido é, de fato, o ideal.
Em todo o setor médico, pesquisas são ferramentas indispensáveis para a obtenção de melhorias. “É essencial que identifiquemos maneiras inovadoras de prestar assistência pré-hospitalar. Estratégias para promover a segurança do paciente e do profissional devem ser traçadas e testadas”, diz o prefácio do documento.
Em concordância com a necessidade de extrair o maior número possível de dados dessa vertente da saúde, Pereira finaliza: “Precisamos levantar essa bandeira para estimular e divulgar as pesquisas, melhorando a prática”. A tese de mestrado de Pereira está em fase de finalização e em breve estará incorporada à literatura médica sobre o assunto.
Referências:
(1) RDC nº 36/2013
(2) Patient safety in emergency medical services: a systematic review of the literature
(3) National EMS Research Agenda
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