Realizada na Espanha, avaliação considera os preceitos do Choosing Wisely para identificar cuidados excessivos entre a população feminina
Na Espanha, pesquisadores avaliaram prontuários eletrônicos a fim de compreender se gênero e idade poderiam estar associados a um maior risco de vivenciar eventos adversos em decorrência de assistência que vai contra os preceitos da saúde baseada em valor, ou seja, cuidados excessivos que geram mais danos do que benefícios.
Segundo a publicação, 60% da população adulta espanhola é submetida, anualmente, a pelo menos uma prescrição considerada excessiva. Na pediatria, esse percentual é de 40%. Além dos prejuízos diretos aos pacientes, há o desperdício de recursos: o país gasta cerca de 290 milhões de euros todos os anos apenas com indicações exageradas de medicamentos como benzodiazepínicos, anti-inflamatórios não esteroides, agentes hipolipemiantes, paracetamol e ibuprofeno.
Porém, diante de um cenário negativo para todos os pacientes, aparentemente as mulheres são ainda mais prejudicadas do que os homens. Além de atrasos diagnósticos, que sabidamente já acometem muitas mulheres, o estudo buscou compreender se o gênero feminino também é mais acometido por práticas de baixo valor em saúde e, como consequência, por eventos adversos decorrentes dessas práticas. Importante enfatizar que os pesquisadores consideraram como eventos adversos lesões resultantes do tratamento ou complicações que levaram à hospitalização prolongada ou à impossibilidade de alta.
Foram testadas, então, em um estudo de coorte retrospectivo com base em cerca de 1.500 prontuários obtidos na atenção primária entre março e agosto de 2023, algumas hipóteses como comparação entre práticas de baixo valor e eventos adversos em decorrência dessas práticas em homens e mulheres em diferentes faixas etárias e se médicos de família dos dois gêneros tendiam a ser mais equitativos na assistência entre homens e mulheres. Para tal, os participantes – que em sua maioria tomavam mais de uma medicação devido a condições pré-existentes como hipertensão e diabete – foram segmentados por faixa etária: entre 18 e 59 anos, entre 60 e 74 anos, e acima de 75 anos.
A definição da assistência excessiva foi baseada na Choosing Wisely, campanha com caráter global que promove informações e recomendações sobre exames, tratamentos e procedimentos desnecessários. E os pesquisadores consideraram, como preconceito de gênero, aquelas diferenças injustificáveis no tratamento entre homens e mulheres.
Resultados: cuidados excessivos entre as mulheres
Os pesquisadores identificaram maior número de práticas de baixo valor nas pacientes do sexo feminino. Enquanto 45,7% das mulheres foram submetidas a essas práticas, entre os homens a taxa foi de 36,5%. Como decorrência dessa assistência que vai contra os preceitos da saúde baseada em valor, as mulheres também sofreram com mais eventos adversos evitáveis (21,3% nas pacientes mulheres e apenas 15,8% nos homens).
Outra descoberta importante foi que na medida em que a idade aumentava, a frequência dessa assistência excessiva também crescia e, com isso, muitos pacientes com 60 anos ou mais chegaram a vivenciar dois ou mais eventos adversos.
O gênero dos médicos de família não parece impactar a frequência das práticas de baixo valor e os eventos adversos delas decorrentes nos pacientes em geral. Ou seja, independentemente do médico ser homem ou mulher, havia um número semelhante de cuidados excessivos nos prontuários dos pacientes por quem estavam responsáveis.
Porém, quando médica e pacientes eram mulheres, havia aumento significativo na probabilidade de práticas de baixo valor e eventos adversos. Em contrapartida, quando o paciente homem era atendido por uma médica mulher, havia menos chance dele vivenciar um evento adverso.
Por fim, os resultados deste estudo espanhol sugerem a necessidade de refletir e avaliar se as mulheres estão, de fato, sendo submetidas a mais cuidados excessivos do que os homens e, com isso, correndo mais riscos desnecessários. Representa um caminho importante para a análise sobre o preconceito de gênero na assistência à saúde.
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