Bactérias multirresistentes: a ameaça
A doutora Flávia Rossi, autoridade em microbiologia e resistência bacteriana, traça paralelo entre a ameaça global e segurança do paciente.
Resistência bacteriana aos antibióticos é fenômeno recente? Certamente, não. “Porém o impacto de novas resistências tem limitado as opções terapêuticas, principalmente nos pacientes hospitalizados”, diz Flávia Rossi, doutora em medicina – FMUSP, diretora médica do Laboratório de Microbiologia HC-FMUSP e membro do Grupo AGISAR- OMS. Em entrevista exclusiva ao IBSP – Instituto Brasileiro de Segurança para o Paciente, ela debate o tema, que, segundo ela, é uma ameaça real à saúde.
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IBSP – É uma ameaça global? Temos risco de retornamos à era pré-antibiótico?
Flávia Rossi – Sim. O reconhecimento do problema global de resistência bacteriana foi recentemente documentado pela OMS e diferentes governos. É um problema sem fronteiras, de difícil solução e de rápida disseminação. Portanto, é uma ameaça real.
IBSP – Qual o impacto na segurança do paciente?
Flávia – A possibilidade de aquisição de bactérias multirresistentes afeta diretamente o desfecho clínico e cirúrgico de todos os pacientes. As consequências podem variar em gravidade e intensidade: prolongamento da recuperação clínica, aumento do tempo de internação, gastos com procedimentos extras, exposição extra aos antibióticos, etc. Tudo levando a uma maior chance de selecionar e agravar ainda mais a incidência de bactérias resistentes.
IBSP – Quais as consequências da resistência bacteriana aos antibióticos além do setor saúde?
Flávia – Antibióticos são bastante utilizados na agropecuária e veterinária e isto leva à dificuldade de controle efetivo do problema. Esta utilização ampla de antibióticos acaba comprometendo a saúde como um todo, pois é um ciclo interligado importante e que deve ser considerado nos processos de gestão da saúde.
IBSP – Quais são as recomendações que a Organização Mundial de Saúde propõe para reduzir a disseminação da resistência?
Flávia – A OMS recomenda uma ação integrada (clínica/veterinária e agricultura). Recentemente, a OMS formalizou um Grupo AGISAR, do qual faço parte, justamente com este enfoque. Conhecer a magnitude do problema da resistência localmente é o primeiro passo para construir um plano de ação. No Brasil, carecemos de um programa integrado e com dados atualizados desta situação.
IBSP – Quais são as principais barreiras para implementação das recomendações da OMS?
Flávia – No Brasil, há uma carência de Laboratórios de Microbiologia que deveriam gerar dados de resistência em tempo real, o que dificulta planos gestores e guias terapêuticos baseados em evidencias locais.
IBSP – Como você avalia a microbiologia nos hospitais brasileiros?
Flávia – Infelizmente, os dados apurados pela ANVISA indicam um problema sério relacionado aos insumos, infraestrutura e RH, o que reflete diretamente no Programa de Qualidade com impacto no aumento das taxas de resistência bacteriana, que são extremamente altas.
IBSP – Temos uma metodologia para identificar a resistência e ela é padronizada para os laboratórios de microbiologia nas instituições?
Flávia – Existe sim metodologia bem padronizada, porém a avaliação desta implementação nos hospitais deixa a desejar.
IBSP – As informações sobre resistência bacteriana aos antibióticos são disponíveis nos hospitais? Os médicos têm acesso?
Flávia – Cada hospital possui uma política própria, mas o antibiótico pode ser prescrito por qualquer especialidade e isto dificulta condutas mais uniformes.
IBSP – Qual sua visão sobre o uso de antibióticos nas instituições brasileiras? Temos legislação sobre uso racional de antibióticos?
Flávia – Temos grupos nacionais excelentes, mas o Brasil possui uma desigualdade, bem conhecida de todos. Numa visão macro do Problema da Resistência Bacteriana, creio que estamos com grandes dificuldades nesta área. Podemos medir o tamanho do problema no Brasil em função das altas taxas de resistência registradas em hospitais brasileiros. As consequências da Resistencia Bacteriana, em nosso País, no programa de segurança do paciente são bastante impactantes e devem ser monitoradas.
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