A internação hospitalar de longa permanência pode promover o surgimento das lesões por pressão, alterações de pele apontadas como um dos principais eventos evitáveis. Estudos comprovam que a adoção de boas práticas baseadas em evidência tem o poder de reduzir consideravelmente este tipo de ocorrência. Um programa de melhoria de qualidade aplicado a um hospital em Doha, no Qatar, em 2014 atingiu diminuição de 83,5% na incidência de lesões por pressão em seus pacientes (1).
Na fase de análise, o hospital identificou que a maioria das lesões por pressão ocorriam nos pacientes internados nas Unidades de Terapia Intensiva, sendo que muitas das lesões estavam relacionadas a dispositivos médicos como tubos endotraqueais e máscaras de pressão positiva contínua. Foi criada, então, uma estratégia para redução de 60% na incidência de lesões por pressão naquela unidade hospitalar.
O projeto-piloto foi feito na Unidade de Terapia Intensiva Cardiotorácica que tem 12 leitos ocupados por pacientes vindos de cirurgia cardíaca. Na sequência, o projeto foi estendido para todas as unidades do hospital.
O primeiro passo foi a formação de uma equipe multidisciplinar que, envolvendo médicos, nutricionistas, enfermeiros, fisioterapeutas e até mesmo consultores de qualidade, identificou importantes lacunas na rotina de cuidados. Entre os pontos destacados estavam a falta de avaliação adequada dos pacientes pela utilização da escala de Braden, estratégia que já tinha sido adotada há anos pelo hospital, mas não vinha sendo realizada de forma contínua e correta.
Para sanar esse primeiro ponto, educação continuada foi o caminho encontrado. Além de reeducar os profissionais sobre o uso da escala de Braden por meio de aulas teóricas e práticas, houve reforço periódico dessa prática.
Na sequência foram planejadas mudanças na rotina das equipes a fim de melhorar a qualidade da assistência reduzindo o risco de os pacientes desenvolverem lesões por pressão. A primeira mudança foi a adoção ao SSKIN Bundle, metodologia muito utilizada na Inglaterra que pede atenção a cinco tópicos: garantir a superfície de apoio correta ao paciente; fazer inspeção precoce e regular de sua pele; manter o paciente em movimento; cuidar de incontinência e umidade, garantindo que ele esteja sempre limpo e seco; e investir em nutrição e hidratação, certificando-se que o paciente está sob uma dieta adequada.
Dispositivos médicos
A equipe multidisciplinar responsável pela análise de cenário identificou que muitas das lesões por pressão estavam relacionadas a dispositivos médicos como, por exemplo, tubos nasogástricos e endotraqueais. Para reverter essa situação, uma atitude considerada simples: as ligações do tubo endotraqueal foram reposicionadas seguindo as recomendações do fabricante que, no caso, sugeria o reposicionamento a cada duas horas.
Divulgação de cenário
Outra estratégia adotada foi a divulgação, em local de destaque, dos dados relativos à incidência e prevalência de lesões por pressão. Nesse caso, o objetivo foi demonstrar comprometimento institucional do hospital junto à redução desses eventos adversos.
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Resultados surpreendem
A nova abordagem resultou em redução de 83,4% na incidência de lesões por pressão no hospital, sendo que a contagem anual caiu de 127 ocorrências em 2014 para 21 em 2018. Houve também redução notável na prevalência, que caiu 79,4% (de 9,7 por 100 pacientes para 2 por 100 pacientes).
Importante ressaltar que quando avaliada apenas a incidência de lesões por pressão no estágio 2 – quando há perda da pele em sua espessura parcial com exposição da derme – a redução foi ainda mais significativa: 87,7%. Essa observação mostra que a adoção de novas práticas impediu que as lesões iniciais progredissem para estágios mais severos.
Assim, o estudo destaca, como pontos fortes, a implementação de novas práticas baseadas em evidências; a sustentação dos resultados; a atualização profissional da equipe de enfermagem; o envolvimento multidisciplinar; a exibição dos dados e a apresentação dos sucessos do projeto em reuniões de líderes.
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Cenário brasileiro
Não há detalhamentos conclusivos sobre a incidência de lesão por pressão nos hospitais do Brasil, porém o Protocolo para Prevenção de Lesão por Pressão (2) do Ministério da Saúde menciona que um estudo realizado em um hospital geral universitário evidenciou incidência de 39,81%. Para a elaboração de uma boa estratégia de prevenção a esses eventos, o documento compartilhado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) reforça seis etapas essenciais:
1. Avaliação de lesão por pressão na admissão de todos os pacientes
2. Reavaliação diária de risco de desenvolvimento de lesão por pressão de todos os pacientes internados
3. Inspeção diária da pele
4. Manejo da umidade com manutenção do paciente seco e com a pele hidratada
5. Otimização da nutrição e da hidratação
6. Minimização da pressão
Nota-se que as diretrizes nacionais coincidem em muitos pontos com o sugerido no estudo do Qatar pela adoção do SSKIN Bundle.
Educação continuada
Relembrando que os cuidados voltados à prevenção das lesões por pressão envolvem equipes multidisciplinares, o IBSP oferece um curso sobre o assunto para profissionais atuantes nas diversas áreas da saúde. A ideia é ofertar noções básicas para o reconhecimento da lesão por pressão, assim como dos fatores de risco associados ao seu desenvolvimento, além de estratégias de prevenção segundo cada nível de risco.
Ministrado por Kelly Strazzieri Pulido, enfermeira doutora em estomaterapia pela Universidade de São Paulo, o curso aborda conceito, etiologia, epidemiologia, avaliação de risco, classificação e medidas preventivas. Clique AQUI para saber mais.
Referências:
(1) A quality improvement programme to reduce hospital-acquired pressure injuries
(2) Protocolo para Prevenção de Lesão por Pressão (Ministério da Saúde/Anvisa/Fiocruz)
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