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Como tratar pacientes terminais na UTI com cuidados paliativos

Como tratar pacientes terminais na UTI com cuidados paliativos
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Ao transferir os cuidados de casa para os hospitais, é preciso saber lidar com o fim da vida de maneira respeitosa

Estamos vivenciando um era pós-corrida tecnológica. Esta corrida partia das premissas de que quanto mais tecnologia, aparelhos, complexidade tecnológica um serviço tivesse a sua disposição, melhor sua imagem no mercado. Quem nunca passou de frente a um outdoor bem bonito anunciando novos equipamentos no hospital “X”, ou outro dizendo que agora o hospital “Y” tem um novo serviço de cirurgia robótica?

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Essa agregação de valor foi determinada pela própria sociedade, que viu, ao longo dos anos, pessoas viverem cada vez mais tempo, opções de tratamento se tornaram cada vez mais escalonáveis e a interpretação óbvia de tudo isto é: muito positivo. Sem dúvida, quem não quer viver mais e ter mais opções de tratamento?

A grande questão é que a corrida está acabando, pois com rendas cada vez maiores, grandes redes de hospitais, operadoras de saúde começam a englobar novas unidades, crescendo horizontalmente e a maioria delas possui tecnologia e serviços semelhantes. Quando nos deparamos com o presente, olhamos para o lado e vemos que os hospitais são muito parecidos em serviços, acreditações, padronizações.

Isso é o que acredita o Dr. Douglas H. Crispim, médico geriatra e secretário geral da Academia Nacional de Cuidados Paliativos.

Em entrevista ao Portal IBSP, o médico mostra com sensibilidade qual a importância dos cuidados paliativos para pacientes terminais na UTI.

IBSP – Quais são os cuidados paliativos em pacientes terminais na UTI e sua importância?
Douglas H. Crispim – Nós levamos o cuidado para dentro dos hospitais, longe de casa, e levamos a morte para dentro das UTIs. Como será a experiência de uma pessoa na UTI? Os estudos mostram que pessoas sobreviventes de UTI relatam momentos de grande sofrimento, mostram taxas elevadas de depressão quando saem, maiores taxas de sequelas, maior mortalidade. Em geral, não é agradável ao paciente, porém quando necessário e bem indicado, os benefícios suplantam os incômodos.

IBSP – Quais os principais pontos do cuidado na UTI?
Douglas H. Crispim – Existem pontos chave relacionados ao cuidado com pacientes em UTI, sendo um deles se aquele paciente tem indicação de admissão e, se após os esforços já instituídos, ainda está se beneficiando da UTI. Após a corrida da tecnologia, estamos começando a ver os frutos de outra corrida, a corrida do atendimento integral, centrado na pessoa e proporcional para cada paciente. É disso que tratam os cuidados paliativos.

Prova isso é um artigo da Critical Care, de 2014, que mostrava que a redução de mortalidade para as grandes síndromes das unidades intensivas, como SARA, SEPSE, ICC, não é indicativo de que a demanda em cuidados paliativos tenha diminuído, pelo contrário, são indícios de que este tipo de cuidado merece ser ampliado. Quanto mais precoce a identificação de critérios de terminalidade, mais rápida a confecção de um plano terapêutico proporcional para aquele paciente e seus familiares. Dessa forma, obtêm-se melhores os resultados assistenciais e gerenciais.

IBSP – Quando a equipe da UTI deve acionar um profissional de cuidados paliativos?
Douglas H. Crispim – Existe uma grande discussão que envolve o momento adequado para acionar uma equipe especializada em Cuidados Paliativos dentro da UTI. Recomendo que, quando o hospital disponibiliza este tipo de equipe, ela deve ser acionada o mais precoce possível, e incluída na discussão do caso junto ao time da UTI. Isso por que estas equipes estão fortemente ligadas à gestão de leitos e alocação dos pacientes em estruturas mais confortáveis. Equipes de Cuidados Paliativos reduzem a média de permanência de um paciente na UTI.

IBSP – Quais as ações recomendadas?
Douglas H. Crispim – O fast facts recomenda as seguintes ações chave para paliativos em UTI:
– Identificação precoce de uma trajetória de terminalidade através de critérios específicos;
– Direcionar pacientes para locais de cuidados de baixa intensidade (enfermaria, unidade de cuidados paliativos, home hospice);
– Redução da duração da internação na UTI para pacientes adultos, já comprovada;
– Redução no custo dos cuidados, sem aumento da mortalidade, devido ao estabelecimento precoce de metas de tratamento realistas levando a redução no uso de recursos / intervenções de UTI de alto custo;
– Apoio à equipe em situações desafiadoras e emocionalmente ameaçadoras, moralmente angustiantes, conflitos com paciente ou familiar;
– A consulta de cuidados paliativos para pacientes hospitalizados pode reduzir a necessidade de admissão na UTI através do estabelecimento de metas de tratamento que impedem a admissão/
– Continuidade de cuidados quando o paciente transita da UTI para unidade de cuidados paliativos ou de enfermaria, pois a equipe de cuidados paliativos segue o paciente posteriormente.

IBSP – A prática de cuidados paliativos na terapia intensiva deve sempre considerar o interesse da pessoa doente, o respeito aos seus sentimentos e aos desejos de sua família?
Douglas H. Crispim – Ainda estamos distantes de um tempo em que Diretivas Antecipadas de Vontade irão povoar nossos prontuários com belas narrativas baseadas nos valores e preferências dos pacientes em UTI.

Infelizmente, muitas pessoas irão padecer de mal agudo ou subagudo, que as tonarão incapazes de tomar e expressar decisões importantes. Nestes casos, o papel do paliativista é atuar com técnicas de comunicação difícil para identificar e hierarquizar cuidadores, amenizar conflitos e, assim, acessar através dos principais entes queridos, as preferências daquela pessoa.

Quando o paciente consegue expressar suas vontades, ele deve sempre participar das decisões e reuniões. Muitas unidades não incluem o paciente crítico nas reuniões familiares com a equipe por questões logísticas. Nestes casos, deve ser acordado com o paciente quem ele deseja que seja comunicado, e quem poderá participar das reuniões. A transparência das informações para o paciente irá ser a ponte para um cuidado mais empático.

IBSP – Os cuidados paliativos devem ser aplicados em todos os pacientes que são internados na terapia intensiva, independentemente do quadro clínico da pessoa doente?
Douglas H. Crispim – Os Cuidados Paliativos possuem uma ampla gama de atuação. Muitas equipes atuam como parceiros para diversos tratamentos modificadores de doença, mesmo nos casos de doença grave curável. Os cuidados paliativos não especializados podem ser praticados por intensivistas com formação em paliativos, e devem ser estimulados dentro da unidade. Ações paliativas devem ser estimuladas também na prática diária do intensivista.
Pacientes com critérios de fase final de vida na UTI merecem, se disponível, avaliação de equipe multidisciplinar especializada.

IBSP – O controle da dor é um dos pilares dos cuidados paliativos?
Douglas H. Crispim – Controlar a dor e outros sintomas desagradáveis é o primeiro princípio dos cuidados paliativos. Um paciente em UTI corre maior risco de sofrer deste sintoma, mais ainda quando ele se encontra afásico. Os pacientes afásicos, seja por uso de sedação ou ventilação mecânica, ou até por sequelas da enfermidade, possuem um risco maior de terem um sintoma ignorado. Escalas de avaliação de dor não cumprem o seu ofício, tendo em vista que a dor é um sintoma complexo e subjetivo, tendo componentes agudos, subagudos e crônicos. Como avaliar uma dor crônica apenas com dados vegetativos? Imagine-se agora, sentindo dor, e sem conseguir expressar exatamente a intensidade dela, numa unidade longe de familiares. Certamente, você se beneficiaria de um profissional capaz de inferir sintomas através de uma avaliação detalhada, e de tratar este sintoma da melhor maneira rapidamente.

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