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Doenças raras e falhas diagnósticas – Segurança do paciente em risco

Doenças raras e falhas diagnósticas – Segurança do paciente em risco
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De acordo com a publicação “Improving Diagnosis in Health Care” (1), do Instituto de Medicina (IOM), cerca de 5% dos adultos norte-americanos que buscam atendimento ambulatorial vivenciam erros de diagnóstico todos os anos. Além disso, 10% das mortes ocorridas nos EUA podem estar relacionadas a esses erros.

Diversas são as consequências negativas dos erros de diagnóstico, entre elas, progressão descontrolada da doença, sofrimento contínuo, complicações evitáveis com risco de vida, e submissão do paciente a exames ou procedimentos invasivos e desnecessários (que também acarretam custos e desperdícios para o sistema de saúde).

São considerados erros de diagnóstico tanto o atraso involuntário na detecção de doenças, quanto o diagnóstico errado ou perdido. O cenário traçado pelo IOM foi construído sobre uma perspectiva global de saúde. No entanto, ao analisarmos especificamente o panorama dos pacientes com doenças raras – doenças que, segundo o Ministério da Saúde, afetam até 65 pessoas a cada 100 mil indivíduos (2) –, há uma preocupação ainda maior.

Um estudo norte-americano intitulado “How Doctors Think: Common Diagnostic Errors in Clinical Judgment-Lessons from an Undiagnosed and Rare Disease Program” traz algumas percepções – que desmembramos abaixo – quanto a falhas comuns no diagnóstico dessas doenças com o objetivo de alertar sobre os erros já observados e, assim, otimizar a assistência. A publicação reforça que as armadilhas diagnósticas nesses casos podem envolver especificidades da doença, dos profissionais de saúde ou podem ainda estar relacionadas a limitações do sistema (3).

Lembrando que muitas doenças raras trazem consigo sintomas bastante inespecíficos, como perda de peso, fraqueza, fadiga e febre, fazendo com que as impressões diagnósticas iniciais sugiram doenças comuns, o texto aponta que a maioria dos hospitais pediátricos tem atendido pacientes com doenças raras em estágio avançado, que escaparam do diagnóstico correto em sua fase inicial. Os autores deste estudo sugerem que esses casos chegam a 20% dos pacientes(3).

Muitas vezes assistindo aos sintomas persistirem enquanto buscam o diagnóstico correto, passando de especialista em especialista, as famílias podem desenvolver ansiedade, que se torna mais um fator de risco. Ao chegar para uma nova consulta, podem compartilhar com os profissionais informações inespecíficas, que podem gerar dúvidas e dificuldades em correlacionar a sintomatologia relatada ao diagnóstico preciso.

Ao avançar no debate, o estudo “How Doctors Think” sai do contexto do paciente e de seus familiares para abordar o julgamento médico, afirmando ser necessário tomar cuidado com o viés de confirmação, situação na qual o médico passa a buscar apenas informações que confirmem seu pensamento diagnóstico, excluindo outros fatos. Em alguns casos, especialmente quando há profissionais bastante renomados envolvidos, ainda podem ocorrer certos bloqueios que dificultam a comunicação sobre suspeitas advindas de outros membros da equipe(3) .

Uma das alternativas para tentar minimizar esses erros está na constituição de um núcleo de médicos experientes somado a especialistas dedicados que, juntos, analisarão os casos, fugindo das avaliações exclusivamente individuais e que, portanto, ficam restritas ao conhecimento de um único profissional.

Além disso, a publicação reforça que o profissional de saúde não deve descartar diagnósticos muito rapidamente, visto que existem casos de doenças raras que apresentam manifestações não reconhecidas para aquela doença e, ao mesmo tempo, atípicas para doenças comuns. Esse ponto é extremamente importante, pois quando uma possibilidade diagnóstica é descartada, é muito pouco provável que ela volte a ser considerada e, em paralelo, uma vez que um diagnóstico equivocado é incluído no prontuário do paciente, torna-se ainda mais difícil solucioná-lo, pois haverá pouco questionamento sobre aquele caso(3).

Outra situação problemática trazida pelo estudo é a minimização de sinais, sintomas e dados laboratoriais, inclusive laudos. Como exemplo, descreve que apontar “leve taquicardia” pode levar a julgamentos inapropriados. Se a frequência cardíaca está acima da faixa normal, deve ser declarada apenas como taquicardia(3).

Saindo do aspecto puramente humano para adentrar achados laboratoriais, o estudo sugere que nenhum teste tem 100% de sensibilidade e 100% de especificidade. Portanto, os testes não devem ser vistos como conclusivos, mas sim como informações que aumentam ou diminuem probabilidades. Para exemplificar, o artigo relata que somente entre 80% e 90% dos pacientes com endocardite apresentam hemoculturas positivas (achado clínico microbiológico capaz de identificar o agente causal de uma endocardite infecciosa) (3).

Dessa forma, para uma abordagem diagnóstica assertiva, a publicação sugere ser necessário entender que existem muitas particularidades. Há, por exemplo, doenças cujos sinais e sintomas se assemelham. Distúrbios relativos à encefalomielite disseminada aguda, esclerose múltipla, neuromielite óptica e várias leucoencefalopatias frequentemente são similares. Há, também, doenças que se apresentam com manifestações incompletas, atípicas, disfarçadas ou pouco reconhecidas como a sífilis congênita, que pode se apresentar apenas como hepatite(3).

Assim, a avaliação dos pacientes deve englobar os questionamentos a seguir:

  • Essa é uma apresentação incomum de uma doença comum?
  • Esses sinais podem ser de uma doença rara?
  • Esse paciente pode ter mais de uma doença?

Além disso, sempre que um paciente com alguma doença não diagnosticada chegar ao consultório, todo seu prontuário deve ser revisto, considerando-se não ser possível basear o diagnóstico pura e exclusivamente em critérios clínicos publicados. Basta observar que os critérios para a Doença de Kawasaki foram estabelecidos há anos, porém, as experiências mais recentes mostraram alta incidência de manifestações atípicas diferentes das tradicionalmente definidas.

Por fim, depois que o prontuário foi revisto, todos os dados clínicos relevantes foram analisados, e os exames diagnósticos não produziram resultados precisos e confiáveis, a utilização de procedimentos invasivos não deve ser descartada se puder contribuir com a definição e, hoje, é possível contar com a evolução dos testes genéticos que trazem respostas extremamente úteis para detecção de doenças raras.

Referências:

(1) Improving Diagnosis in Health Care

(2) Doenças raras: o que são, causas, tratamento, diagnóstico e prevenção

(3) How Doctors Think: Common Diagnostic Errors in Clinical Judgment-Lessons from an Undiagnosed and Rare Disease Program

M/BR/NP/0010 – Sep-21

 

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