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“Em caso de sepse, tempo é função orgânica”, diz Luciano Azevedo

“Em caso de sepse, tempo é função orgânica”, diz Luciano Azevedo
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A sepse é um problema de saúde pública

Embora não existam estatísticas totalmente acuradas de incidência e mortalidade por conta desta síndrome, estima-se mundialmente que 25 milhões de pessoas são acometidas por sepse todo ano e a cada 2-3 segundos alguém morre por sepse no planeta. “Infelizmente, o Brasil tem uma das maiores mortalidades pela síndrome. Nós estimamos que, no País, devem ocorrer por volta de 650 mil casos das formas mais graves de sepse por ano (sepse grave e choque séptico), com cerca de 250 mil mortes”, comenta o médico intensivista Luciano Azevedo, professor colaborador médico da disciplina de Emergências Clínicas da Universidade de São Paulo e médico pesquisador do Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa.

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IBSP – Qual a relação da sepse com a mortalidade?

Luciano Azevedo – Um estudo mostrou que a taxa de mortalidade brasileira por sepse em UTIs (acima de 50%) é maior do que a de países economicamente semelhantes como a Índia e a Argentina. Estas constatações, por si só, já demonstram a gravidade do problema e a necessidade de politicas de saúde voltadas para o reconhecimento e o tratamento precoce da sepse. Essa mortalidade elevada tem múltiplas causas potenciais, incluindo dificuldade de acesso ao sistema de saúde e pouco conhecimento da população e dos profissionais de saúde sobre a doença.

IBSP – Esses números preocupantes levaram à criação de campanha de combate à sepse?

Luciano Azevedo – Sim. Por causa desses números calamitosos no mundo e no Brasil, em 2012, foi lançada a campanha do Dia Mundial da Sepse, que tem por objetivo aumentar o conhecimento do público leigo e de profissionais de saúde, inserindo a sepse como prioridade de saúde pública. No Brasil, a campanha é coordenada pelo Instituto Latino-Americano de Sepse (www.ilas.org.br), e as atividades podem ser visualizadas em www.diamundialdasepse.com.br.

IBSP – A mortalidade na sepse está diminuindo ou não?

Luciano – Diversos trabalhos da literatura médica têm demonstrado que a chance de um paciente morrer de sepse tem diminuído nos últimos anos, em consequência da melhora do suporte das UTIs em geral e da medicina de forma global. Isso ocorre em diversos países, mas, infelizmente, os poucos dados disponíveis em UTIs brasileiras não têm confirmado semelhante melhora.

Como dito anteriormente, a mortalidade por sepse em UTIs no Brasil tem se mantido acima de 50% desde 2002, quando foram coletados os dados do primeiro estudo. Dados de um estudo do nosso grupo demonstraram ainda que a sepse vem aumentando como causa contribuinte de óbitos no Brasil, entre 2002 e 2010. Vimos ainda que, no Brasil, a mortalidade da sepse é maior em hospitais públicos do que particulares, e isso pode se relacionar à baixa implementação de protocolos de tratamento nos primeiros, bem como elevado “turnover” da equipe e número inadequado de profissionais de saúde em termos de relação paciente/profissional. Em resumo, sepse é uma doença com carga importante para o sistema de saúde nacional e associada a elevados custos.

IBSP – Quais as medidas efetivas para reduzir a mortalidade relacionada à sepse?

Luciano – Em termos de prevenção, mudanças efetivas incluem adequação da cobertura vacinal para populações em risco, como crianças e idosos, notadamente nos países em desenvolvimento. Outras medidas preventivas incluem adequação de saneamento básico, melhora das práticas de higiene da população geral e, principalmente, dos profissionais de saúde na questão da lavagem de mãos. Ainda nesse ponto de vista, aumentar o conhecimento do público leigo e de profissionais de saúde para a sepse vai reduzir o tempo de chegada ao pronto-socorro dos pacientes e aumentar o diagnóstico precoce pelos profissionais de saúde, impactando, assim, na redução da mortalidade.

IBSP – Qual a importância do diagnóstico e tratamento precoce?

Luciano – Assim como em outras doenças como infarto agudo do miocárdio e acidente vascular encefálico, o reconhecimento precoce do paciente séptico com implantação de seu tratamento logo nas primeiras horas é fundamental. Se, para o infarto, tempo é músculo e; para AVC, tempo é cérebro; para sepse, tempo é função orgânica. A demora no diagnóstico e no tratamento ocasiona aumento da chance de disfunção orgânica múltipla, que se associa ao óbito.

Assim, todos os pacientes com sinais e sintomas de infecção associados a dois dos critérios de resposta inflamatória sistêmica (taquicardia, taquipnéia, alteração de leucócitos, febre ou hipotermia) devem ser ativamente investigados para sepse, incluindo pesquisa do foco infeccioso, coleta de culturas e administração de antimicrobianos em até uma hora do diagnóstico.

IBSP – Como é e quais os princípios do tratamento de uma sepse grave? Antibióticos de largo espectro, por via intravenosa, o mais rapidamente possível e, idealmente, na 1ª hora após o diagnóstico ajudam na redução da carga bacteriana ou fúngica?

Luciano – Sendo a sepse uma síndrome, o mais importante é o tratamento da causa de base. No caso especifico, instituição de antibiótico de amplo espectro dentro da primeira hora de suspeita diagnóstica reduz a mortalidade dos pacientes sépticos. Além disso, todos os outros tratamentos são considerados de suporte para prevenção e acompanhamento das disfunções orgânicas. Assim, a terapia inicial com ressuscitação de fluídos deve englobar a infusão de 30 mL/Kg de solução cristaloide. Outras medidas iniciais incluem a mensuração de lactato, coleta de exames laboratoriais para diagnóstico de disfunções orgânicas e uso de drogas vasoativas para pacientes com choque séptico. Todos os pacientes com sepse grave e choque séptico devem ser internados em UTIs para monitorização da adequação de seu tratamento.

IBSP – Qual a letalidade da sepse nos pacientes que estão nas unidades de internação ou unidades de terapia intensiva?

Luciano – Os dados mais representativos da realidade nacional que temos de pacientes com sepse dizem respeito a pacientes internados nas unidades de terapia intensiva. Temos poucas informações dos pacientes em outros locais do hospital, como enfermaria ou PS, mas sabemos que na UTI a letalidade é acima de 50%. Intuitivamente, a letalidade dos pacientes internados na enfermaria que adquirem sepse durante hospitalização é menor, um dado que foi confirmado na base de dados do Instituto Latino-americano de Sepse.

IBSP – Quais são as intervenções necessárias para identificar precocemente estes pacientes?

Luciano – O aspecto mais importante é que pacientes com dois ou mais sinais de síndrome da resposta inflamatória sistêmica (taquicardia, taquipnéia, alteração de leucócitos, febre ou hipotermia) devem ser triados para sepse, com exame físico e coleta de exames para identificação de disfunções orgânicas e gravidade, como lactato. Se realmente houver sepse, deve-se proceder com coleta de culturas e antibioticoterapia dentro da primeira hora de identificação da infecção deve ser iniciada. A suspeição clínica de sepse nos faz identificar precocemente os pacientes e assim, instituir seu tratamento mais rapidamente.

IBSP – Qual são os objetivos da campanha de sobrevivência à sepse?

Luciano – O objetivo primordial da Campanha Sobrevivendo à Sepse (www.survivingsepsis.org) é reduzir a mortalidade por sepse mundialmente em 25%, através de uma série de ações que incluem: aumentar o conhecimento sobre a sepse, melhorar o diagnóstico e o tratamento apropriado, educar profissionais de saúde, desenvolver orientações de tratamento, implementar programas de melhoria de desempenho e melhorar o cuidado após a UTI.

IBSP – Como deve ser o checklist de ações no combate à sepse?

Luciano – O checklist de ações para sepse deve incluir atividades de reconhecimento e tratamento precoce, ações para prevenção de infecções nosocomiais e intervenções para melhoria da qualidade assistencial nos serviços como um todo, pois estas abordagens, à medida que reduzem os eventos adversos, melhoram também a evolução de pacientes sépticos. Por exemplo, o checklist inicial do ILAS inclui avaliação dos critérios de resposta inflamatória sistêmica, coleta de lactato, administração de antimicrobianos, infusão de bolus de fluídos para pacientes hipotensos ou com lactato alterado, avaliação dos critérios hemodinâmicos para infusão de drogas vasopressoras e inotrópicas.

IBSP – Onde o profissional de saúde pode encontrar mais informações sobre sepse em português?

Luciano – Mais informações sobre nossas ferramentas de melhoria da qualidade do atendimento ao paciente séptico se encontram em www.ilas.org.br.

 

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