Notícias de que mulheres morrem repentinamente ou são vítimas de sequelas por causa do uso de absorvente interno surgem de tempos em tempos. Mais recentemente, adolescente britânica Jemma-Louise Roberts, de apenas 13 anos, morta em setembro deste ano, ganhou destaque na mídia por ter sido acometida pela Síndrome do Choque Tóxico (SCT).
“Falava-se na SCT nos anos 1980, mas não se ouve hoje em dia. Se abordar o tema puder salvar apenas uma vida, já terá valido a pena. Meu marido nunca tinha ouvido falar nessa doença. Se um pai ler sobre isso e sua filha ficar doente, essa informação pode salvar sua vida”, disse Diane, mãe da garota ao jornal “Daily Mail”.
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Apesar de raro, o diagnóstico da doença que assusta mulheres é difícil e a propagação de informações a respeito ajuda a prevenir mortes e outras graves consequências. Em entrevista exclusiva ao IBSP – Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente, o Dr. Reinaldo Salomão, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e presidente do ILAS – Instituto Latino Americano da Sepse, explica como a SCT se desenvolve e dá informações importantes diagnosticar a doença.
IBSP – Como essa sepse grave pode ter sido desencadeada no caso de Jemma-Louise Roberts, de apenas 13 anos?
Reinaldo Salomão – Esses casos são raros, mas trazem uma comoção muito grande, porque acometem indivíduos muito jovens e são extremamente graves. Se não diagnosticados e tratados a tempo podem levar ao óbito. Ela é causada principalmente por uma bactéria Staphylococcus aureus, que tem a capacidade de produzir a toxina do choque tóxico. Essa toxina (TSST-1) vai levar a esse quadro do SCT, da alteração cutânea.
IBSP – Por que essa toxina é tão prejudicial?
Salomão – Essa toxina é um tipo que chamamos de superantígeno, ou seja, ela consegue induzir uma resposta inflamatória mais exuberante, mais grave, do que algumas outras toxinas. A diferença é que ela não depende de uma série de eventos para causar a inflamação. O superantígeno tem sozinho a capacidade de ativar um número muito grande de células da imunidade e desencadear uma ativação inflamatória de forma exuberante.
O paciente vai ficar com alta taxa de toxina, febre alta, queda da pressão (por não oxigenar todas as células), alteração de permeabilidade capilar (como se a pessoa tivesse uma vasodilatação), além de hipotensa. A queda de pressão faz com que o corpo não consiga oxigenar bem os tecidos, o que começa a ter comprometimento de diferentes órgãos.
IBSP – Por que o uso de absorvente interno pode ser responsável pela SCT?
Salomão – O uso de absorvente é um determinante muito importante para essa síndrome, mas ela não existe apenas pelo uso do absorvente. Quando a síndrome foi descrita pela primeira vez (1978) foi relatada em 4 meninos e 3 meninas. Na década de 1980, ficou muito claro nos casos que eram descritos que acometia em enorme frequência em meninas que estavam usando absorvente. Uma explicação é que no ambiente onde tem o uso do absorvente acaba havendo uma retenção de sangue e, normalmente, tem um PH mais baixo. Isso propicia que aquela bactéria que está ali presente consiga ativar a produção da toxina que causa a síndrome. Esse ambiente da menstruação e do absorvente pode ajudar.
IBSP – Os sintomas começam de forma súbita e depois evoluem para manifestações mais graves?
Salomão – Quando abre o quadro ele pode ser extremamente rápido. Tanto é que o critério para diagnóstico tem a ver com a gravidade. Existem pródromos (quadro inicial) em crianças que podem manifestar em forma de dores abdominais, diarreia.
IBSP – Quais os sintomas e como o médico pode detectar a Síndrome do Choque Tóxico em prontos-socorros?
Salomão – Se a gente for ver hoje, a mortalidade não é tão grande. Porque, diferente do choque séptico, ele tem um quadro interessante que a infecção em si é fácil de tratar. O diagnóstico é feito mesmo quando o chama atenção da febre alta e a pele fica avermelhada, grosseira e que depois tem descamação. Isso ajuda muito no diagnóstico.
IBSP – Qual o protocolo de tratamento?
Salomão – Segue o mesmo protocolo do tratamento do choque séptico. Mas como é mais uma toxina que está causando tudo isso, tem que fazer a travessia do período toxico para tratar o paciente.
- Hidratação agressiva nas primeiras horas para manter a pressão;
- Uso de drogas vasoativas para reverter o choque;
- Oferta de oxigênio;
- Manejar as disfunções orgânicas que estejam prejudicando órgãos e sistemas;
- E é fundamental lembrar: dar antibióticos que garantam cobertura para Staphylococcus aureus.
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