Como elaborar projetos de gestão de qualidade em saúde: novo modelo mostra impacto em seis níveis (Bigstock)Marcela Buscato
A NOVIDADE – Gestores de um hospital de Londres, o psiquiatra Amar Shah e o diretor financeiro Steven Course publicaram este mês um novo modelo para elaboração de projetos de qualidade em saúde. Em essência, ele ajuda a estruturar os valores que o projeto cria em seis níveis de impacto: 1) experiência do paciente, 2) equipe, 3) produtividade e eficiência, 4) novos custos, 5) custos já existentes e 6) receita
O CONTEXTO – Shah e Innes afirmam que não há muita literatura sobre como demonstrar o impacto e o retorno de investimentos em qualidade. Ao trabalhar no East London NHS Foundation Trust (ELFT), eles perceberam que o trabalho de melhorar qualidade costuma estar separado da maneira como os custos são administrados. Resolveram unir as duas áreas.
A PRÁTICA – Recomenda-se formar um portfólio de projetos de qualidade, pois alguns têm um potencial maior e outros menor de cortar custos existentes – o que enche os olhos dos gestores. É preciso ter um equilíbrio. Para isso, é preciso mapear as áreas em termos de custos, processos existentes e projetos em andamento. A melhor combinação, para potencializar o rendimento, é agir primeiro em setores de alto custo, em que não há processos bem definidos e com poucas ações de melhoria em andamento.
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Entenda o modelo em detalhes na reportagem a seguir:
O desafio de implantar projetos de melhoria da qualidade costuma ir além de encontrar novas – e mais eficientes – maneiras de realizar procedimentos do dia a dia das instituições de saúde. Além de motivar a equipe atarefada que está na linha de frente, é fundamental convencer quem toma as decisões e dá a chancela para a execução de novos projetos. Não bastam bons argumentos: é preciso também falar a mesma linguagem.
O psiquiatra Amar Shah e o farmacêutico Steven Course depararam com esse desafio à frente do departamento de qualidade e finaceiro, respectivamente, do East London NHS Foundation Trust (ELFT), um hospital para doenças mentais e atenção básica em Londres. Eles perceberam que era preciso demonstrar que o aprimoramento da qualidade pode resolver problemas complexos que são prioridade para os gestores. Traduzindo em poucas palavras: como a qualidade afeta os custos. “Não há muita literatura para demonstrar o retorno que podemos ter como organização ao investir em aprimoramento da qualidade”, afirmou Shah, durante sua apresentação no Fórum Internacional de Segurança e Qualidade em Saúde, que aconteceu em abril, em Amsterdã.
Para resolver esse problema, Shah e Course desenvolveram um modelo para descrever aos gestores das organizações o tamanho do retorno de cada projeto de qualidade (1). Eles acabam de lançar o modelo em uma publicação do Royal College of Physicians, o Future Healthcare Journal. O segredo é conjugar qualidade e custo, transformando o custo da qualidade em valor. “Frequentemente, parece que nossos esforços para melhorar qualidade estão completamente separados da maneira como administramos custos”, diz Shah. “Precisamos pensar de uma maneira que coloque as duas coisas juntas.”
Shah e Course se basearam em modelos de grandes especialistas de gestão da qualidade, como o japonês Noriaki Kano, que enfatiza a satisfação do consumidor, e o radiologista americano Stephen J. Swensen, que se tornou referência por seu trabalho em qualidade na Clínica Mayo. Eles estabelecem pilares centrais a serem levados em consideração no desenvolvimento de um projeto.
Três perguntas norteiam a filosofia de Kano, hoje professor da emérito da Universidade de Tokyo, que desenvolveu seu modelo nos anos 1980, não especificamente para a saúde: 1) é possível eliminar problemas de qualidade que surgem porque as expectativas dos clientes não são supridas? 2) é possível reduzir custos significativamente e manter ou aumentar a qualidade? 3) é possível expandir as expectativas dos clientes ao fornecer produtos e serviços que normalmente não são valorizados?
Já a abordagem de Swensen (2) estrutura os projetos em quatro categorias: 1) melhora da experiência dos clientes (os pacientes), 2) benefícios para a reputação da organização 3) efeitos sobre a equipe, a cultura organizacional e o orgulho de fazer parte dela (a que ele se refere pelo termo em francês “esprit de corps”) e 4) retorno financeiro.
O novo modelo de Shah e Course criou um híbrido dos dois anteriores, na tentativa de deixá-lo mais completo. Eles recomendam descrever e apresentar um projeto de gestão da qualidade em saúde dividindo-o em seis níveis de impacto:
1º) Experiência do paciente: mostre quais são os benefícios para a atividade-fim.
Esse nível de impacto se alinha totalmente ao propósito central do negócio, por isso, ele muito importante: são os benefícios para os pacientes, os cuidadores e a família (a quem servimos). Trata-se da redução de úlceras de pressão, redução de medicações não tomadas pelos pacientes, melhora de satisfação dos pacientes etc….
2º) Equipe: explique os benefícios sobre o trabalho dos funcionários.
É importante mostrar o projeto reforçará o sentimento de autonomia, de fazer a diferença, além de conectar a equipe aos propósitos da organização. Isso favorece times fortes e coesos.
3º) Produtividade e eficiência: mostre análises que repensam a conduta antiga, para fazer mais com menos.
Gera um impacto grande, já que a demanda só aumenta. Um exemplo é estudar o fluxo de entrada dos pacientes para acelerar o atendimento, pode liberar capacidade sem precisar fazer investimentos.
4º) Novos custos: apresente o impacto de evitar o problema que o projeto resolve.
São os benefícios para evitar custos que não são planejados, invíveis em um primeiro momento. Estime os custos de lidar com cada evento adverso ou variável que está tentando melhorar.
5º) Custos antigos: demonstre como o projeto libera capacidade/recursos usados sem necessidade.
Esse é o nível que todo mundo lembra de mostrar na hora de fazer o projeto. Qual é o custo já previsto que o projeto elimina do sistema?
6º) Receita: explique como melhora a imagem e pode atrair novos negócios e oportunidades de receita
Esse benefício confere uma vantagem competitiva. Se a organização conseguir mostrar que é um prestador de serviços de alta qualidade, pode atrair negócios. O projeto pode, inclusive, criar novas fontes de receita, ao exportar know-how e treinamento para outras instituições.
O autores alertam que é preciso pensar em um portfólio de projetos, para criar um equilíbrio. Nem todos cortarão custos já existentes inteiramente. A maior parte dos impactos costuma ser sobre evitar custos futuros, não sobre liberar caixa – mas até esses existem, só que em número menor.
Para criar esse portfólio diversificado de projetos, o ideal é pedir para cada setor da instituição identificar potencial para redução de custos. Áreas que costuma ser boas candidatas são aquelas em que o custo é alto e não há processos bem definidos: gasta-se pouca energia para conseguir bons rendimentos. Por isso, é fundamental mapear os custos das áreas e fazer diagramas de processos, para entender onde há espaço para melhoras.
SAIBA MAIS
(1) Shah, Amar; Course, Steven. Building the business case for quality improvement: a framework for evaluating return on investment future. Hosp J June (2018) 5:132-137; doi:10.7861/futurehosp.5-2-132sen:
(2) Swensen SJ, Dilling JA, Mc Carty PM, Bolton JW, Harper CM Jr. The business case for health-care quality improvement. J Patient Saf. 2013 Mar;9(1):44-52. doi: 10.1097/PTS.0b013e3182753e33.
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