Na saúde, o ciclo de cuidados é composto por muitos atores, entre eles os profissionais do setor divididos em dezenas de categorias e os pacientes, ponto final da cadeia. Será que todos têm a mesma compreensão da relevância de debater os erros na assistência? Uma pesquisa divulgada recentemente pelo Patient Safety Movement (1) mostra que não.
Com a pandemia de COVID-19, o mundo acendeu um alerta sobre possíveis lacunas nos sistemas de saúde, visto que foram desvendados problemas diversos relativos a recursos humanos, infraestrutura e insumos em um momento de crise onde havia muita pressão tanto sobre os trabalhadores da linha de frente no combate ao novo coronavírus quanto sobre os pacientes que, infectados ou não, passaram a temer o cenário.
Mesmo diante desse panorama, quando saúde passou a ser o tema mais abordado na mídia e nas rodas de conversa das comunidades, o estudo observou um fator crítico: ainda que médicos, enfermeiros, técnicos e outros tantos profissionais que lidam diariamente com o atendimento aos pacientes tenham total compreensão sobre a gravidade de lacunas que acarretam erros, o paciente em si não coloca essa temática como prioridade. Então, o Patient Safety Movement investiu em uma pesquisa para explorar a percepção da segurança do paciente entre profissionais e cidadãos.
Entre abril e maio de 2020, os pesquisadores selecionaram dois grupos para participar do projeto. O primeiro composto por cidadãos dos Estados Unidos sem qualquer atuação no ramo da saúde e o segundo composto por enfermeiros, anestesiologistas, administradores hospitalares, líderes dos setores de qualidade e prevenção de infecções, e fornecedores da saúde.
A primeira grande diferença de percepção sobre a relevância dos cuidados inseguros entre a comunidade geral e os profissionais foi apontada quando os participantes foram questionados sobre suas três principais preocupações relacionadas aos sistemas de saúde. Os trabalhadores da área apontaram, em ordem de relevância, a segurança do paciente; erros cometidos pelos trabalhadores da saúde; e a saúde dos profissionais do setor.
Enquanto isso, os cidadãos colocaram, como preocupações prioritárias: custos com a saúde; a saúde dos profissionais da área; e o acesso a hospitais e tratamentos de qualidade. Entre a comunidade, a segurança do paciente apareceu apenas na quinta colocação enquanto erros cometidos pelos profissionais da saúde foi a penúltima colocada entre as 11 preocupações sugeridas.
Uma outra pergunta feita pelo estudo reforça que o paciente não tem total compreensão sobre a relevância dos erros assistenciais. Enquanto 58% dos profissionais da saúde disseram se preocupar diariamente com os erros; 40% dos cidadãos disseram que se preocupam com isso apenas eventualmente, 26% disseram raramente ter esse tipo de preocupação e 7% confirmaram que nunca nem cogitaram esse assunto.
Porque o erro ocorre?
Quando questionados quais as principais razões para que erros ocorressem nos sistemas de saúde, os entrevistados que não atuam no setor atrelaram as falhas principalmente ao fato de que os profissionais podem estar sobrecarregados e estressados, o que também mostra que na visão do cidadão comum, o erro está prioritariamente ligado ao indivíduo, e não ao sistema como um todo.
Se o cidadão atribui o erro como uma falha do indivíduo, naturalmente ele acredita que a melhor maneira de o reduzir está na punição do trabalhador. Enquanto isso, quem trabalha com esse setor, compreende que punir o profissional nunca é o melhor caminho. A pesquisa mostrou que os profissionais da saúde compartilham da ideia de que incentivar as boas práticas de segurança e reconhecer quem as segue são atitudes mais significativas na busca pela redução das taxas de erros que acarretam danos aos pacientes.
Engajamento é fundamental
Em tempos em que o engajamento do paciente com seu ciclo de cuidados é tema constante dos debates em saúde, o estudo do Patient Safety Movement traz à tona a necessidade de abordar as temáticas da segurança do paciente justamente entre o público mais interessado no assunto: o cidadão que depende do sistema para preservar sua saúde e garantir os melhores prognósticos caso patologias sejam diagnosticadas.
Para ampliar o conhecimento dos pacientes quanto à relevância do tema, outros estudos mostram que campanhas de conscientização surtem efeito. Em Massachusetts, nos Estados Unidos, após esforços diversos para abordar a segurança do paciente junto ao público geral, os resultados foram motivadores. Antes da campanha, 77% dos entrevistados disseram nunca ter tido contato com relatórios sobre erros na assistência. Após a campanha, esse número de pessoas que não tinham nenhum conhecimento sobre o assunto caiu para 52%.
Outra pesquisa também trazida pelo estudo da Patient Safety Movement mostra que muitos norte-americanos não compreendiam o que de fato era um erro assistencial, visto que nomeavam reais situações de falhas como apenas complicações do tratamento. Tanto que 64% dos entrevistados disseram nunca ter tido nenhum contato com erros, seja no seu próprio cuidado, seja no cuidado de parentes e pessoas próximas.
Referências:
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