Estudos listam percepções dos profissionais da saúde acerca da cultura de segurança do paciente de suas organizações
Uma cultura de segurança forte e robusta capaz de desenvolver processos de baixo risco, criar sistemas altamente confiáveis e produzir resultados realmente eficazes depende de pilares diversos como comunicação eficaz, liderança, trabalho em equipe, bom sistema de notificação de incidentes, processos de melhoria contínua e incentivo à capacitação profissional.
Todos esses tópicos precisam ser avaliados para que as organizações de saúde possam otimizar seus ambientes corporativos em prol da segurança de seus pacientes. Infelizmente, porém, o cenário na América Latina não parece ser de muita atenção ao monitoramento da cultura de segurança.
Uma revisão sistemática (1) recentemente divulgada teve dificuldades para reunir estudos capazes de prover uma avaliação sobre como anda a cultura de segurança dos hospitais locais.
Foram encontrados apenas 30 estudos possíveis de serem incluídos na revisão por utilizarem o Hospital Survey on Patient Safety Culture (HSOPSC), um dos principais instrumentos do mundo para dimensionar a cultura de segurança nas instituições de saúde e que, inclusive, tem uma versão em português validada (confira AQUI).
Esses estudos vinham de cinco países, sendo que o Brasil era o mais participativo, com 22 deles (também participaram México, Argentina, Peru e Colômbia).
Ao todo, o estudo envolveu quase 11 mil participantes, a maioria profissionais da enfermagem, mas também médicos e outros trabalhadores da saúde. Interessante observar que, na média, a percepção positiva sobre a cultura de segurança foi baixa, pouco acima de 48%.
Porém, houve uma discrepância importante entre as diferentes classes profissionais: médicos tinham uma percepção mais positiva do que enfermeiros.
A revisão sugere que essa diferença pode ser resultado da baixa disponibilidade de profissionais de enfermagem, o que acarreta sobrecarga de trabalho.
Por exemplo, em países da OCDE há, em média, 8,8 enfermeiros para cada 1.000 habitantes. Na América Latina o cenário é bem diferente, com apenas 2,6 enfermeiros para cada 1.000 habitantes.
Além do acúmulo de atividades para esses trabalhadores, a escassez profissional, de acordo com a literatura, pode aumentar o risco de morte, o tempo de internação, e a readmissão em 30 dias após a alta.
Por isso, acredita-se que os enfermeiros tenham uma percepção mais negativa sobre o nível da cultura de segurança de suas corporações, assim como comentou o Dr. Lucas Zambon, Diretor científico do IBSP:
Os profissionais de enfermagem passam muito mais tempo em contato com o paciente e o dia-a-dia da organização em comparação com médicos, o que pode influenciar a percepção da realidade de ambas as profissões.
Cultura de segurança – Resposta não punitiva a erros
Uma das dimensões com percepção mais negativa entre os enfermeiros que participaram dos estudos incluídos na revisão sistemática foi “resposta não punitiva a erros”. Essa descoberta foi similar em outros países em desenvolvimento.
Estudo transversal (2) realizado no Paquistão, por exemplo, que também utilizou o HSOPSC como forma de dimensionar os pilares de cultura de segurança, identificou que “resposta não punitiva a erros” também foi uma das dimensões com pior percepção entre médicos e enfermeiros.
Entre os dois artigos, a revisão sistemática e o estudo transversal, surgem suas justificativas. A primeira delas refere-se ao fato de que essas sociedades possivelmente ainda mantêm questões de inferiorização da mulher nos postos de trabalho.
O setor de enfermagem tende a ser predominantemente ocupado por mulheres que ainda sofrem com atributos misóginos, atitudes machistas e patriarcado.
No Brasil, por exemplo, segundo pesquisa do COFEN, quase 85% dos postos de trabalho da enfermagem são ocupados por mulheres. Assim, o que a revisão sugere é uma mudança importante para que a cultura das organizações seja cada vez menos centrada no gênero.
A outra justificativa está relacionada à forte cultura de culpa de profissionais que não recebem apoio e, portanto, têm medo de denunciar erros, o que leva à subnotificação e posterior dificuldade em enxergar a realidade da instituição para traçar planos de melhoria.
Fomento à cultura de segurança
Medir a cultura de segurança tem sido uma estratégia importante para identificação de áreas que necessitam de melhorias de qualidade.
Considerando que a maioria dos países latino-americanos não têm o hábito de medir e monitorar a cultura de segurança das organizações de saúde, a revisão indica uma importante inclusão do tema na formação profissional de todas as classes que atuam nos ambientes hospitalares.
Enquanto em toda a América Latina a revisão sistemática conseguiu apenas 30 estudos que utilizavam o HSOPSC, somente na Noruega, por exemplo, 20 estudos nesse perfil estavam disponíveis, tal qual explica o Dr. Lucas Zambon:
É preciso fomentar pesquisas de cultura de segurança do paciente nas diferentes organizações de saúde do nosso país, e mais do que isso, ampliar a divulgação de resultados paras ampliar o debate na comunidade.
Referências:
(1) Patient Safety Culture in Latin American Hospitals: A Systematic Review with Meta-Analysis
(2) Patient Safety Culture: A Healthcare Provider’s Prospect
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