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Com falta de evidências científicas comprovando benefícios, orientação para uso de Cloroquina e Hidroxicloroquina do Ministério da Saúde gera debate quanto à segurança dos pacientes

Com falta de evidências científicas comprovando benefícios, orientação para uso de Cloroquina e Hidroxicloroquina do Ministério da Saúde gera debate quanto à segurança dos pacientes
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IBSP: Segurança do Paciente - Com falta de evidências científicas comprovando benefícios, orientação para uso de Cloroquina e Hidroxicloroquina do Ministério da Saúde gera debate quanto à segurança dos pacientesNesta quarta-feira, 20 de maio, o Ministério da Saúde publicou um documento (1) com orientações para tratamento medicamentoso precoce de pacientes com diagnóstico da COVID-19. A divulgação deste posicionamento focado  no uso da cloroquina e da hidroxicloroquina, associada ou não à azitromicina, gerou ampla repercussão devido à falta de evidências científicas que comprovam os benefícios dessas substâncias nos pacientes infectados pelo novo coronavírus.

A orientação preocupa as autoridades pois coloca em risco a segurança dos pacientes. O assunto foi abordado em uma live realizada pelo doutor Lucas Zambon, diretor científico do IBSP (Instituto Brasileiro para Segurança do Paciente), no Instagram oficial da entidade (clique AQUI para assistir).

O posicionamento do Ministério da Saúde surge dois dias após a AMIB (Associação de Medicina Intensiva Brasileira), a SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia) e a SBPT (Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia) publicarem as Diretrizes para o Tratamento Farmacológico da COVID-19 (2) enfatizando que não há, no momento, nenhum medicamento com eficácia comprovada para tratamento de casos de infecção pelo SARS-CoV-2.

Com apoio técnico de hospitais de referência no território nacional como o Hospital Moinhos de Vento, o Hospital Alemão Oswaldo Cruz e o Hospital Sírio-Libanês, o documento – que cita outras drogas já analisadas durante a pandemia – inclusive recomenda não utilizar hidroxicloroquina ou cloroquina de rotina no tratamento da COVID-19, tampouco a combinação dessas substâncias com azitromicina.

No cenário internacional, estudos também não trazem dados suficientemente positivos para a recomendação dessas substâncias para tratamento medicamentoso precoce. Publicada no The British Medical Journal, a pesquisa Hydroxychloroquine in patients with mainly mild to moderate coronavirus disease 2019: open label, randomised controlled trial (3) que considerou 150 pacientes com diagnóstico de COVID-19 confirmado concluiu que a administração de hidroxicloroquina não resultou em uma maior probabilidade de redução da infecção no comparativo com o tratamento padrão. Além disso, afirmou que os eventos adversos foram maiores nos pacientes que fizeram uso da substância do que nos pacientes que não a utilizaram.

Outro estudo de coorte retrospectivo, desta vez publicado pelo JAMA Network, e intitulado Association of Treatment With Hydroxychloroquine or Azithromycin With In-Hospital Mortality in Patients With COVID-19 in New York State (4) contou com 1.438 pacientes hospitalizados em Nova Iorque para descrever resultados clínicos de tratamentos com hidroxicloroquina associada ou não à azitromicina. Na ocasião, concluiu que o tratamento com essas medicações não gerou diferenças na mortalidade hospitalar quando comparado com nenhum outro tratamento.

Um terceiro estudo também leva a comunidade médica a se preocupar quanto à orientação divulgada nesta quarta-feira pelo Ministério da Saúde. A publicação no The New England Journal of Medicine (5) também analisa pacientes hospitalizados com COVID-19. No caso, foram observados 1.446 casos, e a conclusão também foi de que a administração da hidroxicloroquina não poderia ser associada a mudanças na mortalidade dos pacientes.

Riscos à segurança dos pacientes

A falta de evidências científicas de que o tratamento precoce com cloroquina e hidroxicloroquina traz benefícios coloca em risco a segurança do paciente e recomendar o uso dessas substâncias também vai contra as diretrizes da OMS (Organização Mundial da Saúde).

Em um guia específico (6) sobre gerenciamento de questões éticas em surtos de doenças infecciosas, a OMS trata do uso emergencial de intervenções que ainda não foram comprovadas pela pesquisa mundial. Nesta seção, lista algumas restrições.

Para a OMS, em uma situação de pandemia as entidades podem ofertar aos pacientes algumas intervenções experimentais em caráter emergencial desde que:

1. Não haja tratamento eficaz já comprovado;

2. Não seja possível investir em estudos clínicos imediatos;

3. Existam dados preliminares suportando a eficácia e a segurança dessas intervenções;

4. Autoridades relevantes ou comitês de ética devidamente qualificados aprovem o uso;

5. Sejam disponibilizados os recursos adequados para garantir que os riscos sejam minimizados;

6. Haja consentimento do paciente;

7. Haja monitoramento e documentação dos resultados, que devem ser compartilhados rapidamente com as comunidades médicas e científicas.

Hoje, no atual cenário vivenciado no Brasil, das sete recomendações a indicação de uso da cloroquina e da hidroxicloroquina fere cinco. Apesar de não haver um tratamento já com eficácia comprovada e de que o paciente pode consentir o uso dos medicamentos, o mundo já está realizando estudos científicos a respeito do tema; já temos dados preliminares e esses dados não garantem a segurança da intervenção; não há autoridades que validem o uso desses medicamentos para infectados pelo novo coronavírus; o sistema de saúde brasileiro está sofrendo com a sobrecarga, sendo que muitos estados já entraram em colapso, e pacientes com eventos adversos gerados pela administração de cloroquina ou hidroxicloroquina terão de disputar os poucos leitos vagos durante a pandemia; e em um cenário de sobrecarga não será possível garantir monitoramento e compartilhamento de informações adequadamente com especialistas para tomada de decisões.

A medida brasileira vai contra decisões acertadas recentemente por órgãos norte-americanos. A FDA (Food and Drug Administration) (7) se posicionou contra o uso de hidroxicloroquina ou cloroquina para COVID-19 fora do ambiente hospitalar ou de ensaio clínico devido ao risco de problemas cardíacos. Além disso, o NIH (National Institutes of Health) (8) divulgou as diretrizes de tratamento para os EUA e nesse documento não recomenda o uso de nenhuma droga como profilaxia e se posiciona de forma bastante incisiva sobre antivirais que vêm sendo tema de debate, ao não recomendar a cloroquina e a hidroxicloroquina pois os estudos existentes além de não comprovarem eficácia, apontam evidências de riscos.

Referências:

(1) Orientações do Ministério da Saúde para Tratamento Medicamentoso Precoce de Pacientes com Diagnóstico da Covid-19

(2) Diretrizes para o Tratamento Farmacológico da COVID-19

(3) Hydroxychloroquine in patients with mainly mild to moderate coronavirus disease 2019: open label, randomised controlled trial

(4) Association of Treatment With Hydroxychloroquine or Azithromycin With In-Hospital Mortality in Patients With COVID-19 in New York State

(5) Observational Study of Hydroxychloroquine in Hospitalized Patients with Covid-19

(6) Guidance For Managing Ethical Issues In Infectious Disease Outbreaks

(7) FDA cautions against use of hydroxychloroquine or chloroquine for COVID-19 outside of the hospital setting or a clinical trial due to risk of heart rhythm problems

(8) COVID-19 Treatment Guidelines Panel – Coronavirus Disease 2019 – Treatment Guidelines – National Institutes of Health

 

 

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