Documento traz diretrizes baseadas em evidências e resultados do programa Saúde em Nossas Mãos
Em março de 2025, o Ministério da Saúde lançou um white paper com diretrizes para enfrentar as três infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS) de maior impacto no sistema público: a infecção primária de corrente sanguínea (IPCS), a pneumonia associada à ventilação mecânica (PAV) e a infecção do trato urinário associada a cateter vesical de demora (ITU-AC).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), nos países desenvolvidos cerca de 7 em cada 100 pacientes internados desenvolvem IRAS. Em países em desenvolvimento, essa taxa chega a 10%. Enquanto a prevalência entre hospitalizados varia entre 3,5% e 12% na América do Norte e Europa, na América Latina as taxas podem ser até cinco vezes maiores. Em unidades de terapia intensiva, o risco é ainda mais elevado: estima-se que a probabilidade de aquisição de IRAS seja 30% maior nesse ambiente, representando fator de risco independente para mortalidade.
A diferença entre os contextos de países de alta e baixa renda reflete a capacidade de implementar ações eficazes de prevenção e controle. Sistemas de vigilância mais robustos, maior disponibilidade de recursos e adesão rigorosa a protocolos de higiene e segurança favorecem os primeiros, enquanto os desafios persistem em sistemas menos estruturados.
O panorama brasileiro das IRAS
Dados consolidados da Anvisa revelam uma ampla variação geográfica na incidência de IRAS nas UTIs do Brasil:
- Infecção primária de corrente sanguínea (IPCS): Em grande parte dos estados, a densidade varia entre 2,4 e 4,8%. No entanto, Acre e Piauí apresentam incidências significativamente maiores, acima de 9,7% e entre 7,3% e 9,7%, respectivamente.
- Pneumonia associada à ventilação (PAV): Apresenta discrepâncias regionais ainda mais expressivas. No Acre, a incidência ultrapassa 26,5%, enquanto no Mato Grosso do Sul varia entre 21% e 26,4%. Os estados com os melhores indicadores (entre 2% e 9,9%) incluem Pará, Mato Grosso, Maranhão, Amapá, Ceará, Pernambuco, Alagoas, Rio de Janeiro e São Paulo.
- Infecção do trato urinário (ITU-AC): Os índices variam amplamente, de 0% a 11,6%, evidenciando a desigualdade no controle das IRAS entre diferentes regiões do país.
Estratégias de intervenção
O white paper apresenta três diagramas direcionadores com recomendações práticas para a redução das IRAS prioritárias nas UTIs. Entre as principais estratégias estão:
- Fortalecimento das equipes multiprofissionais, promovendo colaboração ativa no planejamento e na assistência;
- Cultura organizacional voltada à qualidade e segurança, com incentivo ao diálogo aberto, liderança engajada e compartilhamento de aprendizados;
- Cuidado centrado no paciente e na família, estimulando a participação ativa nas decisões e comunicação transparente com as equipes.
Resultados concretos: duas fases de atuação
O white paper foi elaborado pelo PROADI-SUS (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do Sistema Único de Saúde) e integra o projeto Saúde em Nossas Mãos, iniciado em 2017. O programa visa qualificar a assistência hospitalar, aprimorar a segurança do paciente e disseminar boas práticas entre instituições públicas de saúde.
Com mais de 300 UTIs participantes em todo o Brasil ao longo de seis anos, o projeto se consolidou como referência na redução de IRAS e no fortalecimento de práticas assistenciais sustentáveis e eficazes.
Primeira fase (2018–2020)
Durante a primeira etapa, 116 UTIs participaram ativamente, com a implementação de oficinas, palestras, storyboards e visitas técnicas realizadas por representantes do Ministério da Saúde. As atividades promoveram um ambiente de aprendizado coletivo, revisão de práticas e desenvolvimento de novas ideias.
Os resultados no período pré-pandemia foram expressivos:
- IPCS: redução de 43,5%
- PAV: redução de 52,1%
- ITU-AC: redução de 65,8%
Ao incluir o período pandêmico, as reduções foram de 32,7%, 42,4% e 65,8%, respectivamente, sendo que a ITU-AC manteve sua tendência de queda mesmo durante os momentos mais críticos da covid-19.
Outro destaque foi o aumento na adesão à higienização das mãos, que passou de 69,6% para 76,2%, com maior frequência e rigor no monitoramento. A análise econômica indicou uma economia estimada de R$ 354 milhões para os 12 hospitais participantes que tiveram as finanças monitoradas.
Segunda fase (2021–2023)
Com base na experiência anterior, o segundo ciclo do projeto (que também abrange parte da pandemia) manteve foco na abordagem multidisciplinar e na autonomia das equipes de melhoria, que passaram a enviar resultados mensais para avaliação das lideranças.
Ao final dos três anos:
- IPCS: redução de 44%
- PAV: redução de 52%
- ITU-AC: redução de 54%
Essas reduções evitaram aproximadamente 7,3 mil infecções e salvaram 2,3 mil vidas. A adesão à higienização das mãos aumentou 21% e a estimativa de economia foi de R$ 427 milhões, com retorno de R$ 8,90 para cada R$ 1 investido.
Com esses dados apurados, os resultados robustos do projeto Saúde em Nossas Mãos demonstram que a aplicação sistemática de estratégias baseadas em evidências, somadas ao engajamento de equipes multidisciplinares e à cultura de aprendizado contínuo, é eficaz na redução das IRAS. Isso representa um avanço significativo na segurança dos pacientes atendidos em UTIs brasileiras.
O material está disponível para download AQUI e detalha o modelo de governança, critérios de seleção das UTIs participantes, estrutura dos grupos de trabalho e a trilha metodológica recomendada.
Referências:
(1) White Paper – Saúde em Nossas Mãos: Melhorando a Segurança do Paciente em Larga Escala no Brasil
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