Estudo analisa, dos pontos de vista de profissionais da saúde e de familiares, as vantagens e desvantagens da utilização de jardins por pacientes com demência
Dentro do conceito de cuidado centrado na pessoa, muito tem sido dito sobre a importância da permanência em espaços ao ar livre e próximos à natureza no tratamento e melhor qualidade de vida de pessoas com demência. Para checar se de fato há essa correlação positiva, um estudo foi conduzido por pesquisadores australianos que entrevistaram — após a abertura de um jardim em uma unidade psiquiátrica de alta dependência para idosos — equipes e familiares de pacientes a fim de observar se a possibilidade de estar em um ambiente aberto traria benefícios como a redução de comportamentos desafiadores sem impactar a sua segurança ampliando, por exemplo, as taxas de quedas entre eles.
Considerando que os pacientes envolvidos no estudo tinham no mínimo 65 anos e apresentavam sintomas comportamentais e psicológicos de demência, bem como comorbidades que os levavam à necessidade de cuidados de alta intensidade, a taxa de quedas da unidade já era considerada alta.
Doze funcionários das equipes multidisciplinares (entre médicos, psiquiatras e enfermeiros) foram convidados a responder uma pesquisa on-line com 17 perguntas sobre os pacientes e a utilização do jardim, com destaque a observações importantes sobre o espaço. Em paralelo, familiares como cônjuges, filhos e irmãos dos pacientes com demência foram entrevistados para falar sobre as perspectivas, as opiniões e suas experiências sobre o uso do local (muitos pacientes não tinham capacidade cognitiva para responder por si só, por esse motivo os familiares foram os protagonistas).
Jardim, particularidades e observações importantes
Um dos pontos altos do estudo diz respeito à preocupação com a infraestrutura desses espaços ao ar livre para que as pessoas com demência pudessem utilizá-los com segurança. Para isso, além do cuidado centrado na pessoa, é importante dar a devida atenção ao design desses locais para serem acessíveis e promoverem estímulos sensoriais sem colocar esses pacientes em risco.
Na unidade onde o estudo foi realizado, havia um espaço ao ar livre com áreas concretadas e grama artificial, além de um canteiro e bancos. Esse local foi reformado para então ser utilizado como espaço terapêutico para receber os pacientes e servir de suporte a treinamentos de mobilidade e reabilitação.
Para garantir a segurança, a boa experiência do paciente e o atendimento às necessidades específicas, a reforma do espaço do estudo foi conduzida pela equipe multidisciplinar da unidade, liderada pelo terapeuta ocupacional, com envolvimento próximo da enfermagem e da fisioterapia.
O jardim, então, recebeu caminhos não lineares, superfícies variadas, obstáculos e até mesmo pontes e escadas para treinamento de força física e equilíbrio. Também foram inseridos no espaço recursos interativos montados em paredes e árvores, bem como plantações sensoriais, assentos e canteiros elevados. Independentemente da estrutura de segurança do local, qualquer paciente que o frequentasse deveria estar supervisionado.
Entre os pacientes utilizando o jardim durante o período do estudo, de acordo com a pesquisa, muitos praticavam exercícios físicos, participavam de atividades sociais e clínicas (como avaliações) e também de caminhadas, observação do local, conversas e mobilização. Os profissionais contatados relataram que a possibilidade de frequentar o jardim trouxe, aos pacientes, novas opções de atividades e de avaliações, conexão com a natureza, ar fresco, acesso à luz solar e a uma vista atraente. Houve, inclusive, menção ao fato de que o jardim atraiu pássaros e insetos, o que é positivo. Quando questionados o que os levava a encaminhar os pacientes para o espaço, disseram que os principais fatores eram o interesse do paciente (demonstrado pelo olhar direcionado ao local ou pelo pedido direto), o humor e as condições clínicas deles.
Para os familiares, todo esse cuidado centrado na pessoa foi considerado benéfico, gerando bem-estar e experiências positivas para os pacientes e sendo uma possibilidade de criação de um vínculo entre esses pacientes e suas próprias identidades em um local alheio às características hospitalares.
Resultados
A queda — que já era uma preocupação na unidade — foi ponto central da discussão. Nos seis meses que antecederam a abertura do jardim, 10 pacientes sofreram 30 quedas, sendo que uma única pessoa caiu 14 vezes. Depois da abertura do espaço, cinco pacientes sofreram 32 quedas, sendo que um único paciente caiu 20 vezes. Porém, nenhuma das quedas observadas ocorreu no novo local.
Assim, após a abertura do jardim para utilização dos pacientes, foi observado um aumento não significativo na taxa mensal de quedas por 100 dias de leito, o que reflete, na verdade, um aumento geral nesse indicador.
Ao mesmo tempo, nos seis meses antes da abertura do jardim, foram verificados 27 comportamentos desafiadores em 12 pacientes, sendo que o máximo de incidentes por paciente foram seis. Já nos seis meses seguintes à abertura, seis pacientes vivenciaram 16 comportamentos desafiadores, sendo que um único indivíduo vivenciou cinco deles. Relevante, também, destacar, que nenhum desses episódios ocorreu no novo espaço terapêutico.
Com isso, nota-se uma queda significativa dos comportamentos desafiadores no primeiro mês de abertura do jardim, seguida por um aumento não significativo desses episódios a cada 30 dias.
Por fim, o estudo sugere que a manutenção de jardins e espaços diversos ao ar livre, que contribuem para uma boa experiência do paciente, são bem-vistos por eles, por seus familiares e por profissionais de saúde, mesmo que existam desafios atrelados à sua utilização.
Referência
(1) Impact of an improved outdoor space on people with dementia in a hospital unit
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