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Qualidade e segurança: queixas de pacientes reforçam falhas no sistema de saúde australiano

Qualidade e segurança: queixas de pacientes reforçam falhas no sistema de saúde australiano
Qualidade e segurança: queixas de pacientes reforçam falhas no sistema de saúde australiano
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Centenas de casos de cirurgias ginecológicas foram avaliados e apontaram problemas na comunicação, condutas inadequadas e falhas de qualidade generalizadas 

A colocação de uma malha biocompatível por meio de uma incisão na vagina da paciente é um procedimento bastante comum para tratar prolapso de órgãos pélvicos e incontinência urinária. Porém, há alta prevalência de danos associados a essa cirurgia entre as mulheres australianas, tanto que o governo local realizou uma investigação para compreender melhor as causas desses problemas e como ajustá-los. 

Com base nessa investigação, um estudo recentemente publicado analisou centenas de casos e relatos públicos de mulheres submetidas a essas cirurgias para entender como os danos aconteceram e como foi a experiência por elas vivenciadas. Os pesquisadores tinham um objetivo principal: avaliar, sob a perspectiva das pacientes, quais fatores levaram a falhas no sistema de qualidade e segurança. 

Entre todos os casos analisados, somente 11,4% das mulheres declararam ter obtido resultados positivos após o procedimento. Com a maioria dos relatos apontando resultados negativos, os pesquisadores chegaram à quatro explicações sobre a qualidade da assistência. 

Condutas inadequadas para uma assistência de qualidade 

Mulheres apontaram algumas condutas médicas que seriam inadequadas a altos padrões de qualidade, como a falta de consentimento para a implantação da malha, falhas na explicação sobre o procedimento, no acompanhamento da paciente, na documentação, e culpabilização da vítima. O inquérito, porém, não confirmou essa percepção.  

Falhas na comunicação entre médico e paciente 

Os relatos mostram que muitas mulheres tiveram dificuldade em apresentar suas queixas pós-procedimentos, sendo desacreditadas, enfrentando barreiras no acesso aos especialistas e, ao conseguir contatá-los, sendo abordadas com brutalidade. Uma delas declarou: “tive alta sem resposta, apenas alívio com medicamentos e efeitos colaterais que quase me mataram”. Outras comentaram, inclusive, a implantação de dispositivos sem consentimento (incluindo produtos já com alerta nacional de não utilização devido à falta de segurança) e que receberam instruções para buscar ajuda psicológica, indicando que os sintomas não eram reais. 

Atraso no alerta por parte das agências reguladoras 

Algumas mulheres apontaram um certo atraso no alerta sobre falhas de segurança e eficácia na implantação de malhas biocompatíveis para tratamento de incontinência ou prolapso de órgãos pélvicos na Austrália. Houve, inclusive, uma comparação com outro caso público: enquanto o medicamento talidomida foi retirado do mercado após somente 200 casos de malformação congênita, mesmo com cerca de 2.500 relatos negativos sobre a implantação da malha biocompatível, nenhuma ação foi tomada. 

Falhas no sistema de saúde 

Os relatos também sugerem falhas no sistema de saúde australiano que levavam as mulheres a enfrentar longas filas de espera, consultas extremamente curtas (15 minutos) para que todas as dúvidas pudessem ser sanadas, e falta de transparência. Além disso, foram apontados falta de qualidade nos registros médicos que também não estavam à disposição das pacientes.  

Importante enfatizar que essas quatro explicações foram extraídas única e exclusivamente com base nas percepções das pacientes. E, com base nelas, os pesquisadores listaram três mecanismos de erros: 

  • Médicos ignoravam sintomas relatados e as lesões eram apontadas como não evitáveis, deixando de notificá-las; 
  • Pacientes não conseguiam contatar os médicos responsáveis e especialistas para participar da tomada de decisão de forma transparente; tampouco tinham acesso prático às agências reguladoras para reclamações; 
  • Serviços de saúde pecam ao estabelecer limites de segurança com base na proporção de prejudicados, e não no número absoluto de casos ou na gravidade dos danos, o que levou os problemas relacionados a esse tipo de procedimento a ficarem desconhecidos por quase duas décadas na Austrália. 

Assim, os pesquisadores responsáveis pelo estudo sugerem que, na avaliação de resultado dos procedimentos, as perspectivas clínicas dos médicos foram privilegiadas em detrimento das perspectivas das pacientes. Com isso, seriam necessárias diversas intervenções de qualidade em todo o sistema de saúde para que melhorias fossem realmente implementadas. 

Neste sentido, o Dr. Lucas Zambon, Diretor Científico do IBSP, afirma:

Estudos como este reforçam a necessidade de termos compreensão de Sistemas Adaptativos Complexos, e de lançarmos mãos de intensas investigações com ferramentas como o Protocolo de Londres […] Outro aprendizado deste estudo é que a causalidade para qualquer incidente de Segurança do Paciente é múltipla, e o olhar do paciente precisa ser levado em consideração na análise.

Referência 

(1) Patients’ perspectives on quality and patient safety failures: lessons learned from an inquiry into transvaginal mesh in Australia 

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